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RELAÇÕES BRASIL E ARGENTINA AO LONGO DO TEMPO

Atendendo ao pedido de um costumeiro seguidor das nossas matérias neste importante meio de comunicação, nos solicitando que comentássemos sobre o Mercosul e as relações do Brasil com a Argentina, faremos algumas observações sobre a participação do Brasil no Mercado Comum do Sul – Mercosul (abordando as suas relações com os países que compõem esse importante bloco econômico, que é a nossa especialidade) e abordaremos as relações políticas entre esses dois países (um breve histórico até a atualidade, sem nos aprofundarmos nas suas diversas alternâncias), tema com mais realce  face às alternâncias de poder na atualidade.

Sobre as relações brasileiras com o Mercosul, alguns dados demonstrarão a importância desse bloco para o comportamento das exportações brasileiras:

  • Entre janeiro e agosto/2021 o Mercosul absorveu US$ 10,88 bilhões, aparecendo como o 5º maior mercado de destino das nossas exportações (atrás de China, União Europeia, Estados Unidos e ASEAN, respectivamente);
  • Do total de US$ 10,88 bilhões exportados para o Mercosul, US$ 7,76 bilhões foram destinados para a Argentina (isto significa que a Argentina é o nosso 3º maior mercado de destino, se considerarmos as exportações destinadas aos países individualmente);
  • A importância do mercado argentino é significativa para as exportações brasileiras (representa 70% das exportações para o Mercosul) e fica realçada pelo fato de registrar um aumento de 51,6% em relação ao mesmo período de 2020;
  • Outro importante registro é que o saldo da balança comercial Brasil-Argentina cresceu 185% em 2021 em relação a 2020.

Fica assim demonstrado que o Mercosul tem um papel importante para a economia brasileira, principalmente as relações com a Argentina (as importações brasileiras originárias desse país cresceram 46% em relação a 2020).

Embora haja essa importância econômica observada acima, as relações políticas com a Argentina apresentam, historicamente, muitos avanços e recuos. Alguns registros de fatos mais marcantes são suficientes para mostrar esse comportamento instável:

  • Em 1825, a fim de conter o “expansionismo imperial brasileiro” que se declarava sucessor dos direitos de Portugal sobre a província Cisplatina, a Argentina declara a “Guerra contra o Império do Brasil” (esse é o registro que consta na história argentina). Para o Brasil, esse conflito foi considerado como “Guerra da Cisplatina”;
  • Na segunda metade do século XIX, o Paraguai despontava como uma provável potência e com autonomia sobre o sistema capitalista internacional. Como isso incomodava o Brasil, a Argentina e o Uruguai, em 1865 foi firmado um tratado entre esses países para vencer Solano López, e, terminado o conflito, as tropas brasileiras permaneceram em solo paraguaio para proteção do avanço territorial argentino. Essa atitude do Brasil por pouco não provoca outra guerra com a Argentina, possibilidade que só foi aliviada em 1876 com a assinatura do acordo de fronteiras entre Buenos Aires e Assunção;
  • Embora na 1ª Guerra Mundial tenha havido neutralidade de ambas as partes, a neutralidade da Argentina na 2ª Guerra Mundial contrasta com a transformação do Brasil no maior aliado dos Estados Unidos na América Latina. Isso reacende a rivalidade argentina e faz com que a mesma busque maior autonomia econômica;
  • Os regimes militares brasileiro e argentino fazem uma importante aproximação, principalmente nas áreas hidroelétrica e nuclear, com as assinaturas do Tratado Tripartite de Cooperação Técnico-Operativa (entre Brasil, Argentina e Paraguai, viabilizando a construção das hidrelétricas de Itaipu e Corpus) e do Acordo de Cooperação para o Desenvolvimento e a Aplicação dos Usos Pacíficos da Energia Nuclear. Tais entendimentos mostraram, pelo menos entre os militares dos dois países, a existência de uma dinâmica própria nas relações políticas e que modificaram a trajetória turbulenta verificada no passado;
  • No episódio da Guerra das Malvinas, embora o governo brasileiro tenha apoiado a reivindicação argentina, houve certa neutralidade do mesmo (os argentinos esperavam que o governo brasileiro bloqueasse o trânsito aéreo-marítimo na costa brasileira) e isso afetou as boas relações existentes até então e que só foi reestabelecida com a redemocratização dos dois países;
  • O final da “guerra fria” e a ampliação da hegemonia norte-americana trouxeram uma nova ordem para o cenário internacional. Nessa nova ordem o liberalismo econômico passou a orientar as políticas nacionais e novamente Brasil e Argentina se organizam para formar um bloco de integração (essa ação já estava presente na ALALC, mas não tinha a amplitude da integração necessária aos novos tempos) e convidam o Paraguai e o Uruguai para constituírem, em 1991, o Mercosul (restrito às características de uma União Aduaneira). Essa integração é um novo marco das relações entre Brasil e Argentina, conforme dados apresentados no início desta matéria;

Na atualidade, com governantes de vieses antagônicos, as relações políticas entre Brasil e Argentina estão divergentes e sem a mesma intensidade demonstrada na época da formação do Mercosul. Em outros governos, dada a crise econômica que persegue a Argentina desde o início do século XXI, o Brasil foi desfavorecido em diversas ocasiões e algumas cláusulas foram desrespeitadas  por governantes argentinos. Mesmo assim o Mercosul continua ativo e com forte significatividade para a indústria brasileira. Espera-se que essa significatividade proporcione um melhor entendimento entre os governantes e que o Mercosul possa se transformar em um mercado comum efetivamente. Esse é o nosso desejo!

 

Referências

 

CANDEAS, A. W. Relações Brasil-Argentina: uma análise dos avanços e recuos. Revista Brasileira de Política Internacional, v. 48, nº 1, p. 178-213, 2005.

 

COMEX STAT. Exportações e Importações – Geral. Disponível em http://comexstat.mdic.gov.br/pt/geral. Acesso em 01/10/2021

 

São Paulo, 02/10/2021

 

Prof. Dr. Francisco Américo Cassano

Doutor em Ciências Sociais – concentração em Relações Internacionais, Professor e Pesquisador dos temas Internacionalização de Empresas e Relações Econômicas Internacionais.

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