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COMO O MERCADO FINANCEIRO NACIONAL ATRAI OS INVESTIDORES ESTRAGEIROS

Não vamos tratar nesta live de investimentos estrangeiros diretos no setor produtivo nacional, mas sim dos investimentos estrangeiros no mercado financeiro. Já conversamos aqui sobre investimentos estrangeiros e sabemos que o investimento direto no setor produtivo nacional é muito mais desejável do que o investimento estrangeiro especulativo no mercado financeiro. O primeiro é um investimento estável de longo prazo, cria riqueza para o país, o segundo é um investimento volátil que pode ter algumas vantagens para o país, mas também traz muita volatilidade e alguns problemas.

Há diversas razões pelas quais o mercado financeiro nacional pode atrair os investidores estrangeiros.

Para facilitar o entendimento, visto que as razões são diferentes, vamos separar investimentos em renda fixa de investimentos em renda variável.

O investidor estrangeiro observa a remuneração dos investimentos em títulos de renda fixa, particularmente, nos títulos do governo federal. Quando as taxas de remuneração brasileiras estão mais altas que as taxas no mercado internacional, mormente no país de origem do investidor, isto obviamente o atraí.

A taxa de câmbio de entrada e de saída, isto é, no momento da aplicação e no resgate, são importantes, mas sua importância está ligada à diferença entre a taxa de câmbio no momento do investimento e no resgate. Se a taxa de câmbio, durante esse período, estiver razoavelmente estável na entrada do dinheiro estrangeiro e na saída do dinheiro estrangeiro, ela não terá influência na decisão do investidor estrangeiro de investir em renda fixa no Brasil. A taxa de câmbio poderá ter influência no resultado do investidor se variar ao longo do período de aplicação. Vamos a um exemplo numérico para entender melhor isso. Se no momento da aplicação a taxa de remuneração do investimento no exterior for de 2% a.a. e a taxa de remuneração do investimento no Brasil for de 12% a.a., a expectativa do investidor é de ganhar um spread de cerca de 10%. Ou seja, esse investidor hipotético pode pegar dinheiro emprestado no país de origem pagando cerca de 2% a.a. (imaginando taxas de captação e empréstimo aproximadamente iguais para facilitar a explicação) e investir no Brasil recebendo cerca de 12% a.a. Digamos que a taxa de câmbio estivesse no início da aplicação em R$5,00/US$1,00. Imaginemos que o investidor tomou U$1.000,00 emprestados para pagar em 1 ano com juros de 2% a.a. A conversão destes US$1.000,00 daria R$5.000,00 que seriam aplicados no Brasil à taxa de 12% a.a. Ao final da aplicação, o investidor teria R$5.600,00. Se a taxa de câmbio fosse constante ele converteria esses reais e obteria US$1,120,00. Ele teria que quitar o empréstimo e pagaria US$ 1.020,00 tendo um retorno de US$ 100,00 equivalentes a 10% do valor investido (US$1,000,00) que era a expectativa inicial desse investidor.

Se, entretanto, a taxa de câmbio não for estável, podemos fazer duas simulações para efeito de melhor compreensão, na primeira simulação a taxa de câmbio que era de R$5.00/US$1,00 cai após 1 ano para R$4,50/US$1.00 e, em uma segunda simulação, a taxa de câmbio sobe para R$5,50/US$1.00 após 1 ano. No primeiro caso ao obter R$5.600,00 ao fim de um ano, o investidor converteria e obteria US$1.244,44 quitaria sua dívida de US$1.020,00 e ficaria com o resultado de US$224,44 que representam uma margem de 22,44% a.a. Neste caso em que a taxa de câmbio está mais baixa do que no momento da aplicação o investidor estrangeiro recebeu uma remuneração substancialmente mais alta do que sua expectativa inicial.

Se, por outro lado, a taxa de câmbio no momento do resgate da aplicação estivesse em R$5,50/US$1,00 então o investidor converteria seus R$5.600,00 e receberia US$1,018,18, insuficientes para quitar seu empréstimo de US$1.020,00 causando-lhe um pequeno prejuízo de quase US$2,00 após um ano.

Vamos complicar um pouco o nosso raciocínio agora. E se houver inflação e estivermos tratando de aplicações em títulos pré-fixados, portanto sem correção pela inflação?

Nos títulos pré-fixados a inflação tem o poder de corroer o rendimento. Geralmente a inflação será um problema se for mais alta do que a expectativa, porque, se estiver dentro do valor esperado pelo mercado, já estará precificada no retorno dos títulos.

Assim, por exemplo, um título pré-fixado com vencimento em 01/01/2025 com rendimento bruto de 12,15% a.a., já traz embutido nessa taxa uma inflação média prevista pelo mercado para o período. A julgar pela remuneração de outros títulos do governo pós-fixados, com correção pelo IPCA, essa inflação média prevista para o período deve estar em torno de 6,41% a.a., que não difere muito das expectativas do Boletim Focus. Portanto, a remuneração real do investimento em título pré-fixado deve ser de cerca de 5,40% a.a.

O investidor estrangeiro não vai consumir no Brasil, mas também se preocupa com a inflação interna do país dele, pois investindo US$1.000,00 hoje e recebendo, por exemplo, como em nossa primeira simulação, cerca de US$1.244,44 após um ano, o rendimento nominal seria de US$ 224,44, mas ele teria que descontar a perda de poder aquisitivo da moeda, ocorrida devido à inflação, para obter o rendimento real.

Todos esses fatores complicam a conta da remuneração real que o investidor estrangeiro terá ao final do processo. Mas o objetivo aqui era apenas de demonstrar que essas complicações existem. Bibliografia recomendada no final para quem quiser se aprofundar no assunto.

Sabemos que os investimentos estrangeiros especulativos também se preocupam com renda variável.

Nos investimentos em renda variável, temos alguns problemas novos. A teoria das carteiras recomenda que investidores busquem ampliar seu leque de possibilidades de investimento porque isso leva a uma melhor alocação dos recursos, permitindo uma relação retorno-risco mais favorável. O fato de haver outras ações disponíveis para compra leva a um deslocamento da curva da fronteira-eficiente de Markowitz, fazendo que seja possível obter carteiras com o mesmo retorno-esperado mas com menor risco. Investir em mercados no exterior faz com que o risco sistêmico diminua, permitindo ao investidor obter carteiras com risco menor. Os problemas do câmbio e da inflação, mencionados no caso de investimentos em renda fixa, também existem, aumentando a complexidade da análise para o investidor estrangeiro.

Complexidades à parte, espero que tenha ficado claro que há fatores que atraem o investidor estrangeiro tanto para investimentos em renda fixa como para a investimentos em renda variável. Em renda fixa o diferencial de taxa de juros é o principal fator e em renda variável a diminuição do risco sistêmico é o principal atrativo para o investidor estrangeiro.

Leitura recomendada para aprofundamento:

  1. Klotzle, M.C., Pinto, A. C. F.; Klotzle, A. C. Finanças Internacionais. Rio de Janeiro: Saraiva, 2007.
  2. Elton, E. J.; Gruber, M. J., Brown, S. J., Goetzmann, W. N. Moderna Teoria de Carteiras e análise de investimentos. São Paulo: Atlas, 2003.

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São Paulo, 28 de abril de 2022.

Por Roberto B. Kerr

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