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A RÁDIO PEÃO, O FAKE NEWS E A COMUNICAÇÃO EMPRESARIAL

O que a Rádio Peão, o Fake News têm em comum: a mentira. Uma mentira bem contada pode virar verdade para muitos e pode influenciar o comportamento das pessoas. O filme “O Primeiro Mentiroso” é um bom exemplo disso. O protagonista do filme vive um personagem aparentemente derrotado, sem dinheiro no banco, recém desempregado e desprezado pelas mulheres. Numa ida ao banco ele “inventa” a mentira. A caixa do banco diz que o sistema caiu e que não consegue acessar a conta dele. O personagem alega que tinha uma soma considerável depositado na sua conta. A caixa acredita nele e lhe entrega todo o dinheiro que o personagem disse que tinha. A partir desse momento ele começa a inventar estórias, mentiras ou fake news, as mais espatafúrdias possíveis e acaba virando uma pessoa de grande sucesso. No final do filme ele se mostra vítima das mentiras contadas, fica deprimido e acaba assumindo perante todas as pessoas que era um grande mentiroso.

A Rádio Peão é mais ou menos isso. Trata-se de conversas de corredores ou fofocas, sobre assuntos não oficiais que são travados no cafezinho, no happy hour, no tête-à-tête. Essas conversas ou fofocas, como queiram, são capazes de tornar verdadeiras informações não oficiais, especulando e espalhando assuntos aparentemente confidenciais e sigilosos. São capazes de influenciar as pessoas a acreditarem nessas fofocas e, o pior, podem prejudicar enormemente o clima organizacional. As Fake News também possuem esse poder. São boatos ou mentiras que são disseminadas nos meios sociais sobre pessoas comuns ou celebridades, organizações, movimentos políticos, entre outros, que podem ser prejudicados para atender a determinadas intenções de quem criou as fake news. Diferentemente da Rádio Peão, as Fake News são disseminadas de maneira muito engenhosa. Grupos especialistas que trabalham no submundo da internet (as famosas deep web) criam uma página na internet, de qualquer lugar do mundo e um robô é o responsável de multiplicar as mentiras e os boatos, em questão de segundos, para inúmeras pessoas que possuem acesso à rede. Temos inúmeros exemplos da influência nefasta das Fake News sobre as pessoas.

Mas a questão é: por que as pessoas mentem? A mentira é uma construção social. Nós aprendemos a mentir desde a mais tenra idade. Aprendemos a mentir com nossos pais através de um processo de imitação. Vemos nossos pais ou os adultos ao nosso redor mentindo e tirando vantagem da mentira e imitamos o comportamento deles. Quando o adulto diz para a criança que atendeu ao telefone da casa: diz que eu não estou. Esse adulto está ensinando a criança a mentir. Ou quando as crianças observam o exemplo dos atores de novelas ou de filmes que assistem na televisão.

Outra razão para que aprendamos a mentir é quando queremos nos livrar de uma punição ou de um castigo, decorrente do nosso comportamento, que vai nos trazer algum tipo de dissabor. A mentira pode ser um instrumento para transformar uma consequência ruim em uma grande vantagem pessoal. Por exemplo, o aluno que não se preparou para a prova e cola para tirar nota boa. A cola é uma mentira que transforma a punição pelo mau comportamento (no caso o zero) em uma vantagem pessoal (em 10). Esse comportamento mentiroso pode ser reproduzido, sem maiores constrangimentos, para outras facetas da vida do estudante.

Outro exemplo, como no caso do filme que comentei no início, as vantagens obtidas através da mentira acabam virando prestígio perante as outras pessoas. Ser valorizado e receber a atenção e admiração das outras pessoas eleva a autoestima do mentiroso. O oposto é verdadeiro, isto é, uma pessoa que não é valorizada e admirada pelas outras pessoas pode sentir-se excluída do seu grupo de identidade e isso pode levar ao rebaixamento da autoestima. O rebaixamento da autoestima pode fazer com que a pessoa perca sua autoconfiança para relacionar-se, tomar decisões etc… Portanto, a mentira acaba sendo um instrumento psicológico importante, pelo menos por certo tempo, porque quem mente com frequência para se autovalorizar acaba acreditando que a mentira é verdade e essa inversão é um tiro no pé. A mentira precisa ser sustentada com evidências e com argumentos minimamente consistentes e coerentes para que não seja descoberta. Isso dá muito trabalho e gasto de muita energia emocional. É preciso ter muita memória para lembrar integralmente da mentira contada. É por isso que se diz popularmente que a mentira tem perna curta. É difícil sustentá-la por muito tempo, ainda mais sob o olhar atento das redes sociais e da internet.

Bom, estamos falando de um fenômeno próprio da natureza humana. Boatos, fake news, mentiras sempre existiram, bem como a rádio peão nas organizações. Faz parte da nossa história. Precisamos de informações para que possamos tomar decisões e fazer escolhas. Nós precisamos da comunicação, seja oral ou mesmo corporal, da informação para nos posicionarmos no nosso mundo. Daí a necessidade dos gestores organizacionais se preocuparem em estabelecer uma comunicação clara e mais objetiva possível para minimizar os efeitos dos boatos organizacionais. Para evitar os ruídos de comunicação, as conversas atravessadas nos corredores da empresa, no happy hour, no cafezinho enfim, comunicação clara para evitar o famoso “telefone sem fio”. Sem uma comunicação clara a nossa tendência é criar elos de entendimento.

A comunicação formal, quando bem elaborada, pode trazer grandes benefícios para a organização. Os gestores podem utilizar de vários veículos para transmitir ao seu público interno informações claras e objetivas sobre as decisões e interesses organizacionais. Podem usar a intranet, os email´s, os murais, a TV corporativa, se a empresa possuir uma. Passar informações via Facebook, Instagram, Twitter, LinkedIn, entre outros veículos uteis para comunicação interna. O importante é usar o canal adequado para atingir ao seu público. É sempre bom lembrar que o gestor organizacional está lidando com gente, e gente pensa, observa os estímulos presentes no ambiente e tira conclusões.

Quanto maior for a organização, mais crucial se torna o cuidado de se manter uma comunicação clara, objetiva, democrática e participativa. Vamos imaginar uma organização que possua 10 mil funcionários espalhados pelos diversos departamentos da empresa. Imagine se essas pessoas não possuírem informações corretas sobre determinada decisão ou estratégia organizacional. Imagine se elas ficarem descontentes, promovendo paralisações ou incentivando o desperdício de tempo ou de matéria prima. Imagine se essas pessoas resolverem fazer declarações públicas a respeito de decisões obscuras e incertas, pelo menos para essas pessoas, o impacto que esses descontentamentos todos trarão na produtividade ou na imagem da organização?

Vale a pena lembrar também que são os funcionários que vão disseminar as metas, as estratégias, a missão, enfim, as decisões organizacionais. Portanto, o gestor organizacional precisa cuidar com bastante carinho da comunicação interna, caso contrário, a rádio peão vai disseminar boatos, surgirão as fake news e as mentiras para tentar explicar as intenções organizacionais que não estão claras.

 

Prof. Dr. Derly Jardim do Amaral

Doutor em Administração de Empresas – concentração em Comportamento Organizacional. Pesquisador dos temas Gestão de Pessoas, Comportamento Organizacional e Empreendedorismo.

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