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Aprendizagem: alternativa para a sobrevivência organizacional

Derly Jardim do Amaral

 

Todos nós conhecemos um antigo ditado que diz que “cachorro velho não aprende truque novo”. Pois bem, esse ditado que se tornou público em 1523, quando um senhor chamado John Fitzherbert o imortalizou em seu livro “The Boke of Husbandry”.

 

A lógica por trás do ditado é que pessoas idosas não são capazes de aprender nada novo. Contudo, essa lógica não é verdadeira, porque as pessoas continuam aprendendo coisas novas a vida toda. Einstein levou 8 anos para configurar a Teoria da Relatividade. Quando concluiu estava com idade 36 anos. Hoje seria considerado quase um idoso, principalmente para o mercado de trabalho.

 

A burocracia imprime a mesma impressão às organizações no tocante a aprendizagem. Como diz outro ditado: “em time que ganha não se mexe”. A lógica do ditado é a tendência à repetição de soluções já conhecidas. Conhecimento adquirido que são capazes de resolver qualquer tipo de desafio novo.

Ambos os ditados são um engodo! Vou explicar por quê?

 

Por que as pessoas aprendem?

Contrariando os velhos ditados, alguns que citei, as pessoas aprendem porque o que sabem não é capaz de ajudá-las a resolver desafios ou problemas novos. Todas as pessoas possuem uma “cesta cognitiva”, como gosto de nominar, formada por experiências, sentimentos e emoções, memórias, enfim, todas as vivências, positivas ou negativas, que tivemos no passado. Contudo, quando esses registros não são capazes de nos ajudar a responder desafios novos, precisamos rever nossa “cesta cognitiva”. Precisamos reformular conceitos, rever conhecimentos, repensar valores, ponderar emoções e sentimentos, enfim, realinhar o que sabemos com os desafios que se apresentam. Quando renovamos nossa “cesta cognitiva” temos condição de mudar comportamento ou de mudar atitude, lembrando que atitude é uma referência cognitiva, então aprendemos. Aprendizagem significa mudança de atitude ou de comportamento. Fazer diferente o que fazíamos antes.

 

Se não mudamos atitude ou comportamento, não aprendemos. Simples assim! Podemos repetir “de cor” o que memorizamos mais isso não é sinônimo de aprendizado. O aluno pode tirar nota máxima na prova, mas se o conhecimento não for colocado em prática e não ajudar a alterar o comportamento ou a atitude do aluno, ele efetivamente não aprendeu.

 

É bom que se diga que o aprendizado, ou a mudança, não é para piorar a situação. Aprendizado é mudança para melhorar. Tornar-se capaz de responder aos novos desafios de forma mais eficaz e pronta. Conquistar novos comportamentos etc.

 

O mesmo acontece com as organizações?

A resposta para essa pergunta é sim. As organizações aprendem quando mudam o jeito de fazer, alteram o serviço prestado, modificam procedimentos internos em função de conhecimentos novos adquiridos, ajustam valores, enfim, quando as organizações passam a fazer diferente o que faziam antes. A organização aprende quando ela muda!

 

Não podemos nos iludir e pensar que o aprendizado dos funcionários significa aprendizado organizacional. Nem sempre isso acontece, porque o que caracteriza o aprendizado organizacional é a mudança realizada. Contudo, é possível que o aprendizado dos funcionários seja incorporado na rotina da organização. A organização pode criar uma cultura voltada ao aprendizado. Pode se antecipar às demandas de mercado e provocar seus funcionários a adquirirem novos conhecimentos que possam ser incorporados às rotinas. Ela pode ter uma postura pró-ativa em busca de mudança.

 

Ações simples como socialização do conhecimento, isto é, através de reuniões, encontros, bate-papos os funcionários podem dividir com seus colegas o conhecimento adquirido e compartilhar as experiências que obtiveram com as mudanças realizadas. Assim o que é conhecimento individual, também denominado de conhecimento tácito, passa a ser explícito, isto é, de todos. O fantástico disso é que cada pessoa possui uma cesta cognitiva e aplica o conhecimento a partir do seu timing, do seu jeito de fazer e isso pode levar as pessoas a encontrarem novos caminhos na aplicação do conhecimento. Significa que o que é explícito em um determinado momento pode se transformar em tácito em outro e, assim, sucessivamente. Essa é uma atividade cíclica.

 

Não é fácil explicar o processo da aprendizagem

Muitas pessoas têm se debruçado para explicar como as pessoas e as organizações aprendem. No âmbito individual temos, basicamente, duas explicações. No início do século passado surgiu a corrente behaviorista. Os defensores dessa corrente acreditavam que poderiam ensinar qualquer coisa para qualquer pessoa. Defendiam o pressuposto de que diante de estímulos e de reforços as pessoas tenderiam a repetir comportamentos desejáveis. Os comportamentos desejáveis poderiam ser estimulados ou provocados e quando surgissem seriam reforçados, criando o comportamento desejado. Ou poderiam acontecer espontaneamente e depois serem reforçados.

 

A outra corrente é composta de várias abordagens e é denominada de cognitivista. As pessoas aprendem porque querem aprender, porque estão motivadas a aprender, porque veem benefícios com aquele aprendizado, porque vale a pena mudar de comportamento. Essa corrente foca toda a subjetividade humana. A capacidade humana de criação, de imaginação, as emoções e sentimentos humanos, as experiências passadas e a motivação contribuem para o processo da aprendizagem. O pressuposto cognitivista se sobrepõe em muito o pressuposto behaviorista, porque a mudança que ele provoca é mais duradoura e mais eficaz.

 

Outros especialistas se debruçaram para explicar como e quais são os passos que levam as organizações a aprenderem. Entre estes estudiosos é possível citar Chris Argyris, Peter Drucker, Warren Bennis, Peter Senge entre tantos outros. Peter Senge, por exemplo, no início da década de 90 concebeu a ideia de que as organizações aprendem quando adotam 5 disciplinas, como ele denominou. Vamos entender disciplinas como posturas organizacionais, isto é, organizações aprendem quando adotam 5 posturas como criação de modelos mentais, compartilhar visões organizacionais, empoderamento das pessoas para que possam criar, quando a organização promove o aprendizado em equipe, isto é, o conhecimento adquirido e válido para a organização não é de domínio pessoal e  sim coletivo e, por último, estimular a criação de uma visão sistêmica da organização por parte dos funcionários.

 

Enfim

Aprendizagem é mudança de comportamento ou de atitude. Essa afirmação serve tanto para as pessoas como para as organizações. Contudo, nenhuma mudança ocorrerá sem que as pessoas e as organizações estejam dispostas e motivadas à mudança. Mudar é sempre difícil, porque requer alteração de rotina, de hábito, de valor, de procedimento e isso requer investimento. Investimento financeiro e psicológico na conscientização dos atores responsáveis pela mudança. Se as pessoas não quiserem mudar e se a organização não quiser alterar sua forma de agir, ambos estarão com dificuldades de sobrevivência. A área de Treinamento e Desenvolvimento é de fundamental importância nesse processo todo. É ela a área responsável em gestar o conhecimento e fomentar essa mudança.

 

Derly Jardim do Amaral é doutor em Administração de Empresas, professor adjunto e pesquisador da Universidade Presbiteriana Mackenzie nos temas: Gestão de Pessoas, Comportamento Organizacional e Empreendedorismo.Derly Jardim do Amaral

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